Poesia, às Quartas-Feiras

Na quarta-feira, 11 de novembro, a nossa viageira Cacilda Portela nos trouxe algumas notas sobre a leitura que estamos fazendo de Os Moedeiros Falsos, de André Gide e um poema de Fernando Pessoa, Não me Importo com as Rimas.

O romance de André Gide tem nos empolgado nos últimos meses, trata-se de uma obra com mais de 400 páginas, instigante, engenhosa, de estrutura moderna, inovadora, onde a narrativa é em mise en abyme, termo francês usado, pela primeira vez, pelo próprio autor para descrever as narrativas que contêm outras narrativas dentro de si.O Mise en abyme não é um privilégio da Literatura, a técnica pode ser usada na pintura, no cinema, entre outras artes.

As notas escritas por Cacilda Portela sobre o tema de Os Moedeiros Falsos:

OS MOEDEIROS FALSOS: UM ROMANCE DE IDEIAS

*Cacilda Portela

  PARTE I – O TEMA

  •  A história de Os Moedeiros Falsos é narrada, quase sempre, através de conversas e monólogos interiores, o que evidencia uma ficção que não vive do enredo, mas da vida interior dos personagens. São as ideias que encaminham as ações e o movimento.
  • O romance não tem um tema predominante que se concretize na ação. Não há uma ideia global que sustente o planejamento e a ação. Os temas ou as histórias são relativamente simples, mas construídos por ideias particularmente elaboradas e muito engenhosas. As histórias dos personagens se interligam criando a história do romance. Ou melhor, as ideias criam os personagens e o romance.
  • Apesar de não ter um tema predominante, o romance traz com certo nível de profundidade a luta entre os fatos propostos pela realidade e a realidade ideal ou a  luta entre o que o mundo real oferece e o que é feito com a deia que se tem dele.  A rivalidade entre o mundo real e a representação que é feita dele cria o falso como impossibilidade de compreensão de si mesmo (e do outro). “E  o drama da vida consiste na maneira pela qual o mundo real se impõe a nós e a maneira pela qual tentamos impor ao mundo exterior a nossa interpretação particular”.

 

Essas notas serão ampliadas por Cacilda Portela e por outros viageiros, eu inclusive, mas o material aqui exposto já permite a discussão na Oficina sobre o tema do romance.

No momento poético ela nos trouxe uma poesia do heterônimo de Fernando Pessoa, Alberto Caeiro, Não me importo com as rimas, considerado o heterônimo das poesias de aparência simples, mas que envolve certa complexidade filosófica.

Não me importo com as rimas.

Alberto Caeiro

Não me importo com as rimas. Raras vezes

Há duas árvores iguais, uma ao lado da outra.

Penso e escrevo como as flores têm cor

Mas com menos perfeição no meu modo de exprimir-me

Porque me falta a simplicidade divina

De ser todo só o meu exterior

Olho e comovo-me,

Comovo-me como a água corre quando o chão é inclinado,

E a minha poesia é natural corno o levantar-se vento…

 

 

 

* Cacilda Portela é advogada, pesquisadora social, ensaísta.