Eleta Ladoski levou para a Oficina um poeta de primeira linha, Paul Verlaine. Levou-nos a tradução de Manoel Bandeira, do qual ela discordava de algumas palavras como por exemplo, a tradução de langor por consolação. Alguns colegas consideraram que langor era pouco usual na nossa língua e dificilmente ele encontraria melhor rima para coração. Na mesma ocasião, João conseguiu um áudio da leitura do poema em Francês que não reproduzimos aqui, porque encontramos vídeos com imagem e voz bem interessantes. As traduções de Manoel Bandeira são consideradas muito ricas tanto pelo respeito ao texto original como pela qualidade poética.
Chora em meu coração
Paul Verlaine (tradução de Manoel Bandeira)
Chora em meu coração
Como chove lá fora.
Que desconsolação
Me aperta o coração!
xxx
Oh a chuva no telhado
Batendo em doce ruído!
Para as horas de enfado,
Oh a chuva no telhado!
xxx
Chora em ti sem razão,
Coração sem coragem.
Se não houve traição,
Teu luto é sem razão.
.
Certo, é essa a pior dor:
O não saber por que
Sem ódio e sem amor
Há em mim tamanha dor
No original
Il pleure dans mon Coeur
Paul Verlaine
Il pleure dans mon coeur
Comme il pleut sur la ville ;
Quelle est cette langueur
Qui pénètre mon coeur ?
Ô bruit doux de la pluie
Par terre et sur les toits !
Pour un coeur qui s’ennuie,
Ô le chant de la pluie !
Il pleure sans raison
Dans ce coeur qui s’écoeure.
Quoi ! nulle trahison ?…
Ce deuil est sans raison.
C’est bien la pire peine
De ne savoir pourquoi
Sans amour et sans haine
Mon coeur a tant de peine !
Encontrei na tese de DOUTORADO de Aglaé Maria Araújo Fernandes (INTERINSTITUCIONAL UFSC / UFPB / UFCG) sobre os POEMAS TRADUZIDOS DO FRANCÊS AO PORTUGUÊS POR MANUEL BANDEIRA, a seguinte análise sobre Il pleure dans mon Coeur que registro nesse blog:
O poema de Bandeira se estrutura em quatro quadras hexassílabas, com o esquema de rimas abaa, onde a última palavra do primeiro verso se repete no final do quarto verso. O poema se serve da evocação da chuva para investigar o estado de espírito melancólico do sujeito poético. Os elementos chuva e choro são colocados em paralelo e remetem à tristeza. As duas primeiras quadras, à maneira de um ubi sunt, investigam a melancolia sem razão aparente que experimenta o sujeito poético. A terceira quadra esclarece que não há razão para a dor, enquanto a quarta quadra conclui ser justamente a ausência de causa que torna a tristeza mais doída. O original apresenta a estrutura adotada pelo tradutor.
Paul Marie Auguste Verlaine (1844-1896), nasceu em Metz, mas viveu quase sempre em Paris, desde os estudos secundários. Funcionário da Prefeitura, vivia mais na boemia do que trabalhando. Sua primeira aparição no mundo literário foi com Poemas Saturninos, 1866. Embora Parnasiano no início, o seu instinto poético exigia-lhe dar maior agilidade ao alexandrino e utilizar os ritmos ímpares, sugerindo vagos estados por estrofes vaporosas. Marcou a poesia francesa com o seu lirismo musical e evanescente, exercendo forte influência no desenvolvimento do simbolismo. Com Mallarmé e Baudelaire formou o grupo dos chamados poetas decadentes.
Espírito inquieto, ao se casar com Mathild Meauté pareceu ter adquirido certa paz e estabilidade, pelo menos, nos dois primeiros anos. Depois disso, abandonou a esposa e o filho e voltou à vida boêmia, iniciando forte e turbulento romance com Arthur Rimbaud com quem percorreu vários países europeus.
A relação acabou de forma violenta, com Paul Verlaine atirando em Rimbaud várias vezes, inconformado porque este o queria abandonar. Passou dois anos preso, a esposa pediu o divórcio, o que o abalou profundamente, fazendo-o voltar-se para a Religião. Dessa fase vieram os seus livros Romances sans paroles? (1874; Romances sem palavras) e Sagesse? (1880; Sabedoria). Já em liberdade, tenta a reconciliação em vão com Rimbaud. Morou no Reino Unido até 1877, quando então volta à França. Os seus escritos poéticos revelam a influência de Rimbaud na escolha dos tema e dos ritmos. Embora bastante referido no meio intelectual, considerado verdadeiro mestre pelos jovens simbolistas que o consagraram com o título de O Príncipe dos Poetas, a sua degradação física e emocional pelas várias tentativas de reconciliação com a esposa e com Rimbaud, fizeram-no mergulhar cada vez mais no álcool, na boemia.
Paul Verlaine viveu miseravelmente de hospital em hospital e de café em café até à sua morte em 1896, em Paris.
Poesias
Poèmes saturniens (1866)
Les Amies (1867)
Fêtes galantes (1869)
La Bonne chanson (1870)
Romances sans paroles (1874)
Art Poétique (1874)
Sagesse (1880)
Jadis et naguère (1884)
Amour (1888)
Parallèlement (1889)
Dédicaces (1890)
Femmes (1890)
Hombres (1891)
Bonheur (1891)
Chansons pour elle (1891)
Liturgies intimes (1892)
Élégies (1893)
Odes en son honneur (1893)
Dans les limbes (1894)
Épigrammes (1894)
Chair (1896)
Invectives (1896)
Biblio-sonnets (1913)
Œuvres oubliées (1926-1929)
Cellulairement
Prosa
Les Poètes maudits (1884)
Louise Leclercq (1886)
Les Mémoires d’un veuf (1886)
Mes hôpitaux (1891)
Mes prisons (1893)
Quinze jours en Hollande (1893)
Vingt-sept biographies de poètes et littérateurs (em Les Hommes d’aujourd’hui)
Confessions (1895)